Subscribe Twitter Facebook

terça-feira, 23 de fevereiro de 2010

Listamania: Marcelo Ariel

Nascido em Cubatão, Marcelo Ariel é escritor, autor dos livros Me Enterrem Com Minha AR-15 e Tratado dos Anjos Afogados. Quem quiser conhecer mais sobre o seu trabalho, pode visitar o seu blog, Teatro Fantasma, ou conferir essa matéria do programa Entrelinhas, da TV Cultura. Para o listamania desta semana, ele escolheu cinco livros que dialogam com cinco discos. Segue a sua seleção:

1. Lóki, Arnaldo Batista + My Life, Lyn Heijinian


My Life é um livro surpreendente onde os tempos todos são condensados dentro do tempo de um póema, é óbvio que vivemos no tempo dos tempos dentro do tempo, aprendi isso lendo esse livro onde cada ano da vida da poeta americana Lyn Heijnian é transformado em um poema em prosa com muitas camadas de significado. Arnaldo no disco "Lóki" consegue fazer algo similar com os anos sombrios da sua vida e os transforma em canções de uma melancolia doce, canções com uma força lírica surpreendente.

My Life é inédito em português, embora exista uma excelente tadução do professor de pós graduação em Letras da Usp Maurício Salles Vasconcelos á espera de uma editora corajosa, Lóki foi recentemente relançado em cd e é fácil de baixar. Abaixo um trecho de My Life na tradução do Maurício, publicado na revista Agulha:

Você derrama açúcar quando ergue a colher. Meu pai encheu um velho vaso de farmácia com o que chamou de “vidros do mar”, lascas de garrafas velhas arredondadas e texturadas pelo mar, abundantes nas praias. Não existe s o l i d ã o. Isso acaba por se enterrar na veracidade. É como se alguém chapinhasse na água perdida dos próprios olhos. Minha mãe escalou a lata de lixo de modo a amassar o refugo acumulado, mas a lataria estava pouco equilibrada, e quando ela caiu quebrou o braço. Ela só podia aceitar, balançando o ombro. A família tinha pouco dinheiro, mas tinha um bocado de comida. No circo, somente os elefantes eram maiores do que tudo que eu podia imaginar. Pedra em forma de ovo de Colombo, paisagem e gramática. Ela queria algo onde o playground era terra, com grama, sombreado por uma árvore da qual pendia um pneu que era um balanço, e quando ela encontrou aquilo me colocou ali. Essas criaturas são compostas e nada do que fazem deve nos surpreender. [Como se dedicado a nós que “amamos ficar surpresos”]

2. Rimbaud, As iluminações/Uma cerveja no inferno + Chemical Brothers, Dig Your Own Hole



Esta versão dos dois livros mais importantes de Jean Arthur Rimbaud, traduzidos pelo poeta português Mário Cesariny foi a leitura mais deciciva da minha vida, depois de ler este livro decidi voltar a ser poeta, sim todos nós somos poetas, alguns "param de ser" outros "voltam a ser" ou "ao ser" tanto faz... Em Rimbaud/Cesariny as imagens ganham a condição de coisas aut^nomas capazes de transfigurar a realidade em sonho e em profecia ao mesmo tempo. Ouvindo os Chemical Brothers, percebi que a música eletrônica pode ter um efeito cinestésico semelhante ao das drogas alucinógenas, praticamente sonhei acordado lendo Rimbaud enquanto ouvia este disco dos Chemical Brothers.

3. Chet Baker, The last great concert + Clarice Lispector, A descoberta do mundo


Chet baker e o registro de seu último show, bem intensidade e suavidade são os dois nomes de Chet Baker, a voz que ouço cantando dentro dos meus sonhos. Clarice para mim é extamente a mesma coisa, o que Chet baker faz com a voz ela faz com seus textos, investigar os abismos oceânicos da alma humana, passear no fundo deles e voltar para nos contar como são.



4. Elliot Smith, Figure 8 + Sílvia Plath , Poemas

Elliot Smith e Sílvia Plath se completam, imagino Sílvia Plath como a mãe interior de Elliot Smith.



5. Yon Lu, Yon Lu + Juliano Garcia Pessanha, Certeza do agora

Yon Lu, o garoto prodígio que se matou aos dezesseis anos, deixando um disco genial, triste e poderosamente poético como testamento e Juliano Garcia Pessanha e o último livro de sua trilogia formada por: Sabedoria do nunca, Ignorância do sempre e este Certeza do agora. Yon Lu realizou na pratica uma nadificação e exclusão do mundo que Juliano esboça nos seus textos. Ambos negaram a metafísica. Yon Lu foi tragado pelo "buraco negro" que no fundo era ele mesmo e nos deixou canções tristes, verdadeiros blues para cantarmos no exílio nosso de cada dia e Juliano por sua vez escreve a partir desse lugar entre o "Buraco negro" e o "mundo organizado para não ser um mundo vivo". Juliano é um dos maiores poetas brasileiros vivos e funde poesia e filosofia. Yon Lu poderia ter sido o nosso "Nick Drake" ou o nosso "Elliot Smith", pensando bem, ele alcançou os dois e morreu mais cedo por excesso de lucidez.

0 comentários:

Postar um comentário